Espanha e Portugal partilham séculos de história comum e, desde 1986, a pertença à União Europeia.
Essa proximidade faz com que cada vez mais cidadãos portugueses se estabeleçam em Espanha por motivos de trabalho, estudo ou afinidade cultural.
Segundo dados oficiais, são já dezenas de milhares os portugueses que residem de forma permanente em território espanhol — e muitos consideram adquirir a nacionalidade espanhola para gozar plenamente dos mesmos direitos dos espanhóis: votar em eleições gerais, aceder a determinados cargos públicos ou beneficiar de proteção diplomática.
Este artigo destina-se especificamente a portugueses que vivem em Espanha e pretendem obter a nacionalidade espanhola.
Explica as vias previstas no Código Civil espanhol, com especial atenção à nacionalidade por residência — a mais comum entre quem se muda por motivos laborais ou pessoais — e aborda também a dupla nacionalidade entre Portugal e Espanha, clarificando o seu funcionamento e vantagens.
Como se pode obter a nacionalidade espanhola
O ordenamento jurídico espanhol prevê várias formas de adquirir a nacionalidade:
1) Por origem (arts. 17 e 19 do Código Civil esp):
São espanhóis de origem os filhos de pai ou mãe espanhóis e determinados nascidos em Espanha de pais estrangeiros (quando pelo menos um também tenha nascido em Espanha ou se os progenitores não transmitem a sua nacionalidade).
Incluem-se também os menores adotados por espanhóis e os casos de apatridia.
2) Por opção (art. 20 CC esp)
Podem optar pela nacionalidade espanhola aqueles que tenham vínculo direto com cidadãos espanhóis (por filiação ou tutela).
A opção deve ser formalizada no Registo Civil antes dos 20 anos, salvo exceções previstas na lei.
3) Por carta de natureza (art. 21 CC esp)
É uma via discricionária, concedida por Real Decreto em casos de méritos relevantes ou vínculos históricos com Espanha.
4) Por posse de estado (art. 18 CC esp)
Reconhece a nacionalidade a quem a tenha possuído e utilizado de boa-fé durante 10 anos com base em título inscrito no Registo Civil.
5) Por residência (art. 22 CC esp)
É a forma mais comum para estrangeiros, exigindo um período de residência legal e contínua, além de boa conduta e integração na sociedade espanhola.
O que diz a lei sobre a dupla nacionalidade luso-espanhola
Portugal reconhece plenamente a dupla nacionalidade. A legislação portuguesa permite que um cidadão português adquira outra nacionalidade sem perder a portuguesa, salvo se renunciar expressamente a ela.
Por sua vez, a legislação espanhola autoriza a aquisição da nacionalidade por cidadãos de outros Estados da UE, mas não regula expressamente a dupla nacionalidade com todos eles.
O artigo 23 do Código Civil espanhol estabelece, como regra geral, que o estrangeiro deve renunciar à nacionalidade anterior ao adquirir a espanhola.
No entanto, Espanha reconhece exceções históricas e culturais, e Portugal é uma delas.
Apesar de não existir um tratado bilateral específico, Espanha incluiu Portugal entre os países com os quais é possível partilhar a nacionalidade, por considerar o português uma língua ibero-americana e pela estreita relação histórica entre os dois países.
Na prática: os portugueses que obtenham a nacionalidade espanhola não precisam renunciar à nacionalidade portuguesa, e vice-versa, conforme reconhece o Ministério da Justiça espanhol e o art. 24 do Código Civil.
Nacionalidade por residência: requisitos para portugueses
A nacionalidade por residência exige que o requerente comprove um período mínimo de residência legal, contínua e imediatamente anterior à apresentação do pedido, além de cumprir os requisitos de boa conduta e integração.
Trata-se de um procedimento administrativo que termina com um Real Decreto ou decisão da Direção-Geral da Segurança Jurídica e Fé Pública.
(a) Residência legal e contínua:
Qualquer estrangeiro deve residir legalmente em Espanha. No caso dos portugueses (cidadãos da UE), é suficiente possuir um certificado de registo de cidadão da União emitido pelas autoridades espanholas.
Prazos aplicáveis: o artigo 22 do Código Civil espanhol estabelece um prazo geral de 10 anos de residência legal e contínua para solicitar a nacionalidade espanhola. No entanto, este prazo é reduzido para 2 anos para os nacionais de determinados países, entre eles Portugal.
Assim, um português que resida legalmente em Espanha durante dois anos consecutivos já pode iniciar o pedido de nacionalidade, desde que cumpra os demais requisitos. Este é um dos principais benefícios do regime luso-espanhol, uma vantagem face à maioria dos cidadãos europeus, que devem esperar 10 anos.
Nota: a residência deve ser contínua — ausências prolongadas podem interromper o prazo exigido.
O prazo reduz-se ainda para 1 ano em casos específicos:
- portugueses nascidos em Espanha que não exerceram a opção no devido tempo;
- pessoas sob tutela, curatela, guarda ou acolhimento de cidadãos espanhóis por pelo menos dois anos;
- cônjuges de espanhóis (não separados de facto ou legalmente);
- viúvos/as de espanhóis;
- filhos ou netos de espanhóis de origem.
(b) Boa conduta e integração
Além da residência, a lei exige boa conduta cívica, comprovada por certidões de antecedentes criminais de Portugal e de Espanha.
Também é necessário demonstrar integração na sociedade espanhola, geralmente através da aprovação em dois exames do Instituto Cervantes:
- o exame de língua DELE A2
- o exame CCSE, sobre a Constituição e a cultura espanhola.
Os portugueses não estão dispensados destas provas. Em alguns casos (por exemplo, estudos realizados em Espanha) é possível solicitar dispensa, mas recomenda-se aconselhamento jurídico prévio.
Benefícios da dupla nacionalidade luso-espanhola
Obter a nacionalidade espanhola sem perder a portuguesa oferece vantagens significativas:
— permite participar plenamente na vida política espanhola (votar em eleições gerais, concorrer a cargos públicos e determinadas funções reservadas a nacionais) e ter proteção diplomática de ambos os países;
— direitos sociais e laborais: cidadão luso-espanhol tem acesso completo aos sistemas de saúde, educação e segurança social de ambos os países, podendo ainda trabalhar na administração pública espanhola;
— facilidade de reagrupamento familiar: anacionalidade espanhola facilita a entrada e residência de familiares não comunitários (cônjuge, filhos ou pais) em condições mais vantajosas do que o regime geral da UE;
— segurança jurídica e estabilidade: ter duas nacionalidades garante proteção diplomática dupla e reduz o risco de situações de apatridia ou incerteza legal perante futuras mudanças legislativas.
Conclusão
Para os portugueses residentes em Espanha, a nacionalidade por residência é a via principal para se tornarem cidadãos espanhóis.
Graças aos vínculos históricos e culturais entre ambos os países, o prazo de residência reduz-se a dois anos, e o requerente não precisa renunciar à nacionalidade portuguesa.
O processo exige demonstrar boa conduta, aprovação nos exames do Instituto Cervantes e cumprimento dos formalismos de juramento e inscrição, mas oferece como contrapartida a plena cidadania espanhola com manutenção da identidade portuguesa.
Embora os requisitos sejam claros, detalhes técnicos — como residência efetiva, prazos, documentação estrangeira e compatibilidade de nacionalidades — podem gerar dúvidas.
Recorrer a advogados especializados em direito internacional ajuda a evitar erros formais, acelerar os prazos e tomar decisões informadas sobre a melhor forma de obter a nacionalidade espanhola.