Obteve uma sentença em Portugal e quer executá-la em Espanha? Aqui está o guia completo
Cada vez mais cidadãos e empresas portuguesas mantêm relações comerciais, familiares ou patrimoniais com Espanha. Neste contexto, uma pergunta frequente é: como fazer valer em Espanha uma sentença obtida em Portugal?
O reconhecimento e a execução das decisões judiciais portuguesas em Espanha são fundamentais para garantir que os direitos adquiridos em Portugal tenham plena eficácia também além-fronteiras.
Neste artigo, elaborado pelos nossos advogados especializados em direito internacional privado, encontrará uma explicação clara e atualizada sobre o quadro normativo europeu que regula o reconhecimento e a execução das sentenças portuguesas em Espanha, com exemplos práticos e informações essenciais.
Por que poderá necessitar de fazer valer uma sentença portuguesa em Espanha
Imagine que já obteve em Portugal uma sentença favorável: o passo seguinte é torná-la executiva em Espanha, por exemplo para recuperar um crédito, obter o cumprimento de uma obrigação contratual ou fazer valer uma decisão em matéria de família.
Graças ao direito europeu, o procedimento é hoje mais simples, rápido e menos oneroso. No entanto, para evitar erros processuais ou atrasos, é fundamental recorrer a advogados especializados em reconhecimento e execução de sentenças estrangeiras.
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Reconhecimento e execução: qual é a diferença?
Embora muitas vezes os dois conceitos sejam confundidos, existe uma diferença importante entre reconhecimento e execução de uma sentença estrangeira:
- reconhecimento = a sentença portuguesa é aceite como válida em Espanha;
- execução = a sentença não só é válida, mas também é aplicada, se necessário com medidas coercivas (ex.: penhoras).
Na maioria dos casos, os dois passos ocorrem em conjunto.
Qual a lei aplicável ao reconhecimento de uma sentença portuguesa em Espanha?
Convenções bilaterais:
Espanha e Portugal são signatários da Convenção entre o Reino de Espanha e a República Portuguesa relativa à cooperação judiciária em matéria penal e civil, celebrada em Madrid a 19 de novembro de 1997, que permanece em vigor e regula aspetos práticos da cooperação, incluindo o uso do idioma próprio sem exigência de tradução e a dispensa de legalização ou apostila no intercâmbio de documentação judicial (art. 5).
O Regulamento Bruxelas I bis prevalece sobre a aplicação desta convenção bilateral no que respeita às matérias de direito privado por ele abrangidas, mas a convenção bilateral mantém-se em vigor no domínio penal, não abrangido pela normativa da União Europeia.
Direito da UE: o Regulamento Bruxelas I bis
Em especial, para as sentenças cíveis e comerciais aplica-se o Regulamento (UE) 1215/2012 (Bruxelas I bis), que regula a competência jurisdicional, o reconhecimento e a execução das decisões judiciais.
Este regulamento:
- revogou o anterior Regulamento 44/2001 (Bruxelas I);
- aplica-se às sentenças proferidas em processos instaurados após 10 de janeiro de 2015;
- constitui a principal base normativa para fazer valer uma sentença portuguesa em Espanha.
O que estabelece o Regulamento Bruxelas I bis?
Âmbito de aplicação (art. 1): aplica-se às decisões em matéria civil e comercial, independentemente do tipo de tribunal que as tenha proferido.
Estão, porém, excluídas matérias como:
- fiscal, aduaneira, administrativa, responsabilidade do Estado;
- estado e capacidade das pessoas singulares, regimes matrimoniais;
- processos de insolvência (falência, concordatas, etc.);
- segurança social;
- arbitragem;
- obrigações alimentares derivadas de relações familiares;
- sucessões e testamentos.
Para estas matérias, existem regulamentos específicos (ex.: Reg. (UE) 2019/1111 em matéria de divórcio e responsabilidade parental; Reg. (UE) 650/2012 sobre sucessões).

Reconhecimento automático das sentenças portuguesas em Espanha: fim do exequatur
Em tempos era necessário o exequatur para declarar executiva em Espanha uma sentença estrangeira. Hoje já não.
Graças ao Regulamento Bruxelas I bis:
- o reconhecimento é automático (art. 36);
- uma sentença portuguesa tem plena validade em Espanha, sem necessidade de homologação;
- as partes podem invocá-la perante os tribunais espanhóis como se fosse uma sentença nacional.
Documentos necessários (art. 37):
- cópia autêntica da sentença portuguesa;
- certificado emitido pelo tribunal português (art. 53);
- eventual tradução para o espanhol.
O mesmo aplica-se à execução de uma sentença portuguesa em Espanha (arts. 39-40): as sentenças portuguesas executórias também o são em Espanha, sem necessidade de declaração expressa; além disso, são aplicáveis as medidas cautelares previstas na lei espanhola.
Nota importante: embora não seja exigido um processo complexo de exequatur, são necessários alguns trâmites práticos.
Além disso, em certos casos, o tribunal espanhol poderá recusar o reconhecimento de uma sentença portuguesa.
Quando pode ser recusado o reconhecimento ou a execução
O Regulamento Bruxelas I bis prevê que a recusa pode ocorrer em caso de:
- contrariedade à ordem pública espanhola;
- violação do direito de defesa (decisão proferida à revelia sem notificação adequada);
- falta de competência do tribunal português.
Atenção: a sentença portuguesa nunca pode ser reapreciada no mérito (art. 52). O juiz espanhol pode apenas verificar os requisitos formais e os fundamentos de recusa, sem entrar no mérito da causa.
Assim também o reiterou o Tribunal de Justiça da UE, em casos como Trade Agency Ltd v Seramico Investments Ltd (C-619/10), consagrando a proibição de controlo sobre o mérito da decisão estrangeira e reforçando o princípio da confiança mútua entre os sistemas judiciais dos Estados-Membros.
Conclusões: o que deve saber quem tem uma sentença portuguesa a fazer valer em Espanha
Atualmente, o reconhecimento e a execução de uma sentença portuguesa em Espanha são mais rápidos, automáticos e menos dispendiosos. O Regulamento Bruxelas I bis assegura um procedimento harmonizado entre Portugal e Espanha.
Apesar da simplificação, é indispensável o apoio de advogados especializados em direito internacional privado para evitar erros ou atrasos.
Se obteve uma sentença em Portugal e deseja executá-la em Espanha, o nosso escritório de advogados luso-espanhol pode acompanhá-lo em todas as fases do procedimento, garantindo rapidez, segurança jurídica e a proteção dos seus interesses.